Jornalista e Radialista; Gestora de Eventos; Doutora-Mestre Ciência da Religião/PUC-SP; Pesquisa Samba e Afro-religião. Diretora de Comunicação do Vôlei Guarulhos. COJIRA-SP e Coletivo Ojú Obinrín. Foi Assessora do Museu Afro-Brasil; União das Escolas de Samba e Fundação Palmares; Foi Gestora de Comunicação-Prefeitura de Guarulhos. Comentou na Globo News Carnaval 19-20. Âncora PAPO DE BAMBA (BR Brazil). Livros: Orixás no Terreiro Sagrado do Samba e Exu-Mulher e o Matriarcado Nagô.
quinta-feira, 23 de junho de 2022
Ato público em defesa do Quilombo Saracura será dia 2 de julho em frente as obras do metrô no Bixiga
O coletivo Mobiliza Saracura Vai-Vai lançou nesta quinta-feira (23) um manifesto, em defesa
do Sítio Arqueológico encontrado recentemente no local da construção da Linha 6 - Laranja
do metrô, no bairro do Bixiga. O movimento quer a paralisação imediata da obra, para
garantia da preservação do patrimônio encontrado. O documento, assinado até o momento
por quase uma centena de entidades do bairro e da cidade, além de coletivos da
comunidade científica, convoca ato para o próximo dia 2 de julho, com concentração às
10h no local da futura estação de metrô, na Rua Dr. Plínio Barreto, entre as ruas Manuel Dutra e Dr. Lourenço Granto. O objetivo é chamar a atenção para um tema de profundo impacto para a população negra e para a cidadania paulistana e brasileira.
Foto: Elton Santana
"Queremos o metrô no nosso bairro, mas não deixaremos a história do Saracura, do Bixiga e do povo negro ser apagada", explica o documento, destacando que: "a própria empresa de arqueologia contratada pela concessionária, que toca a obra, afirma que a possibilidade de destruição é "certa", devido às obras". Por isso, os especialistas recomendam um projeto de resgate ecológico".
Além disso o movimento reivindica a troca do nome da futura Estação 14 Bis para Estação Saracura/Vai-Vai. "A praça em frente à futura estação já homenageia Santos Dumont e o 14 Bis. Mas a origem negra e rebelde do bairro, que recebeu de braços abertos os imigrantes italianos, vive reiteradas tentativas de apagamento".
Quilombo Saracura e Estação Saracura/Vai-Vai
Em 9 de outubro de 1907, uma crônica do jornal Correio Paulistano descrevia assim a região
do vale do rio Saracura, no Bixiga: "É um pedaço da África. As relíquias da pobre raça,
impellida (sic) pela civilização cosmopolita que invadiu a cidade depois de 88, foi dar alli
naquelas furnas. Uma linha de casebres borda as margens do riacho".
Passados 115 anos, a escavação para a construção da linha 6-Laranja do metrô encontrou
vestígios que comprovam a ocupação da população negra naquele lugar. Os achados
motivaram o registro no Iphan de sítio arqueológico classificado como de alta relevância
pela equipe técnica. "Trata-se de uma pequena área com vestígios arqueológicos, de
transição do século XIX para o XX e primeira metade do XX, localizada às margens do
córrego Saracura", informa o cadastro de abril de 2022 (página 43 do projeto de resgate
arqueológico feito pela empresa contratada pelo metrô).
A área em que os vestígios foram encontrados é apontada há décadas por pesquisadores
como o Quilombo Saracura, comunidade do século XIX que deu origem ao bairro do Bixiga.
Nesta região nasceu, em 1930, o Cordão Vae-Vae, continuidade dessa resistência negra –
as referências ao Quilombo são constantes nos sambas da agremiação. Em 2021, a quadra
da escola foi deslocada para novo endereço no bairro em virtude das obras do metrô.
Da compreensão do valor desses achados para o direito à memória, à terra e à presença
da população negra no bairro e na cidade, o Movimento Estação Saracura Vai-Vai se formou
para lutar pela preservação deste sítio, indo aos órgãos responsáveis cobrar a
formalização do compromisso.
Composto por moradores, sambistas, pesquisadores, militantes negros, o movimento atua
pela paralisação da obra até que seja definido um projeto de preservação; por um
projeto de educação patrimonial e um memorial no local; pela mudança do nome da
estação do metrô de 14 Bis para Saracura Vai-Vai; e pela permanência da população
negra na região, de forma que a chegada do transporte não seja agente de gentrificação. O
movimento deseja o metrô no bairro, mas quer que o território seja respeitado.
"Eu nasci, cresci e tive meus três filhos naquele lugar. Onde era a quadra da Vai-Vai tinha
uma fonte e, quando menino, tomei muito banho por ali. Na Saracura Pequena, nas margens
do rio, as pretas velhas iam lavar roupa", lembra o jornalista Fernando Penteado, 75,
Embaixador Mestre do Samba Paulistano e sambista da Velha Guarda Musical do Vai-Vai,
membro de uma das famílias mais antigas do bairro e neto de Fredericão, um dos
fundadores da agremiação do Bixiga.
“A gente resistiu 50 anos na rua São Vicente, há tempos queriam nos tirar de lá. Só que com
o metrô não teve como brigar", lamenta ele, que tem participado do movimento confiante de
que ainda há tempo de recuperar as memórias negras do bairro. "Temos que continuar
resistindo pela nossa ancestralidade e para que reconheçam que ali sempre foi o Quilombo.
Quem vai contar nossa história depois que o metrô chegar?", questiona.
A historiadora e doutoranda em arqueologia Marília Calazans, também integrante do
movimento, destaca que "o trabalho da arqueologia, apropriado pela comunidade, tem uma
potência de transformação social incrível, de mudança radical da maneira com que a gente
se relaciona com nosso território e passado, e consequentemente com presente e futuro".
Acompanhe: @estacaosaracuravaivai
Para informações e agendamento de entrevistas: estacaosaracuravaivai@gmail.com
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